JOÃO
KEPLER FONTENELLE
Policial com ‘P’ maiúsculo
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A vida tem
mesmo dessas coisas que ninguém explica. Quem poderia imaginar,
por exemplo, que um dos mais atuantes e conhecidos delegados da nossa
polícia civil, titular de várias importantes delegacias
e responsável por investigações de grande repercussão
como o “caso Baumgartem”, só entrou para a corporação
porque queria ter uma carteira de policial? Pois foi graças a
esse desejo ingênuo de um jovem que buscava mais um status do
que uma profissão, que a instituição e a sociedade
ganharam um policial com “P” maiúsculo: João
Kepler Haiden Fontenelle.
“Naquela época, com 22 para 23 anos, estava meio perdido
quanto ao meu futuro. Tinha interrompido os estudos devido a problemas
pessoais e não sabia ainda que rumo tomar na vida. Foi quando
três dos meus melhores amigos – os irmãos Cerejo
e José Garcia – entraram para a Polícia Especial
e ganharam a carteira. Eu não tinha físico para pleitear
a PE, pois sempre fui mirradinho. Então, a solução
foi pedir a meu pai, que era general reformado, que usasse da sua amizade
com o general Ciro de Resende, chefe de Polícia na ocasião,
para arrumar uma vaga para mim na Polícia Civil”, conta
Fontenelle, que assim, em 17 de dezembro de 1952, era nomeado investigador
e realizava seu sonho de ter a sua carteira de policial.
Uma vez dentro da delegacia, porém, o jovem investigador foi
tomando gosto pela atividade. Descobriu que tinha talento para a coisa
e começou a se dedicar e a estudar. Entrou para a universidade
para cursar Direito e, ao se formar, fez curso para comissário,
integrando a famosa turma de 1969, junto com Wladimir Reale, Oscar Soares
de Oliveira e outros grandes nomes da polícia carioca.
Atuação
comunitária
Em 1975, João Fontenelle passou a delegado de polícia
já estreando como titular na 76ª DP (Niterói). Até
o ano de 2000, quando se aposentou compulsoriamente aos 70 anos, ele
exerceu também a titularidade nas delegacias de Mesquita, Tijuca
(por duas vezes), Botafogo (também por duas vezes, sendo que
na segunda passagem ficou três anos), Honório Gurgel, Barra
da Tijuca, Grajaú (duas vezes), Niterói e Jacarepaguá.
Sua derradeira missão como delegado foi em 1999, ao ser designado
para implantar o cartório na unidade do aeroporto internacional
Tom Jobim.
Ao longo de 48 anos de vida policial, 25 dos quais como delegado, Fontenelle
sempre caracterizou sua atuação pela preocupação
com a comunidade à qual servia. “As delegacias que comandei
viviam em obras, pois achava importante melhorar o ambiente de trabalho
tanto para o policial quanto para a população que utilizava
nossos serviços. Pedia ajuda dos comerciantes locais e fazia
as reformas necessárias”, relembra.
Essa mesma consciência social, traço marcante de sua personalidade,
levou o delegado – juntamente com o atual presidente da Adepol-RJ
e outros companheiros – a fundar, em 1972, a seção
regional do Rio de Janeiro da International Police Association (IPA),
que preside até hoje. A IPA é uma organização
filantrópica que conta atualmente com quase 1 milhão de
sócios em todo o mundo, unidos pelo lema servo per amikeco (servir
pela amizade, em esperanto). “A entidade existe desde 1950, fundada
na Inglaterra por um policial. Nela não se distingue hierarquia
das funções, raça ou credo. Somos uma irmandade,
temos um símbolo, um hino e promovemos reuniões anuais
de âmbito internacional, além de eventos locais, na maior
parte das vezes de natureza cultural, onde o policial pode divulgar
sua produção artística ou literária e dar
o ar da sua graça”, explica Fontenelle.
Em plena atividade
Embora aposentado na polícia há cinco anos, João
Fontenelle se mantém ativo como sempre. Além de presidir
a regional da IPA, ele advoga como criminalista e assessora outros advogados.
Autor de três livros de grande sucesso: “Violência
nos Anos Dourados”, “30 Anos sem Caviar” e “Não
Morra, Por Favor”, o delegado exercita sua veia literária
escrevendo artigos, publicados na revista Momento Policial, do Rio Grande
do Sul, da qual é presidente de honra. Atualmente, ele está
contando por capítulos a história da polícia do
Rio de Janeiro no período de 50 a 60, quando a cidade ainda era
a capital da República.
É com esses olhos de especialista em segurança pública
e cronista social, que Fontenelle sintetiza sua visão sobre a
atual situação da nossa polícia. “Antigamente
os chefes eram mais solidários com a tropa. Os desvios de conduta
eram combatidos, mas tudo de forma a não vazar para o público.
Embora hoje haja muito mais tecnologia para facilitar o trabalho do
policial, falta olhar mais pelo homem”.
Ele defende um maior engajamento das entidades representativas dos policiais,
a exemplo do trabalho que é desenvolvido pela Adepol. “É
preciso atuar mais corporativamente. Não sou contra a punição
dos maus policiais, sou contra a divulgação porque isso
atinge a credibilidade da instituição”, opina Fontenelle.
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